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>>Poluíção por chumbo em Santo Amaro da Purificação
por: Patrícia Mazoni e Raul Minas



1. Histórico:

A população da cidade de Santo Amaro da Purificação (BA), distante cerca de 100 km de Salvador, vem sofrendo ao longo dos últimos 32 anos, com as conseqüências da poluição e a contaminação pelo chumbo (Pb) e cádmio (Cd), em nível endêmico.

Neste período foram produzidas e comercializadas cerca de 900 mil toneladas de liga de chumbo, gerando um passivo ambiental de milhões de toneladas de rejeito e cerca de 500 mil toneladas de escória com 3% de concentração de chumbo. Pelos valores atuais do chumbo no mercado mundial, o empreendimento instalado naquela cidade baiana, durante sua vida útil, faturou cerca de US$450 milhões.

A empresa francesa PENARROYA Oxide SA que, atualmente, é líder mundial na produção de óxidos de chumbo destinados à fabricação de baterias, cristais, plásticos e tubos de televisão, criou em 1958, para atuar no Brasil, a subsidiária COBRAC - Companhia Brasileira de Chumbo. A Companhia Brasileira de Chumbo (COBRAC) começou a operar em Santo Amaro da Purificação-Bahia, no ano de 1960, na forma de uma usina para produzir lingotes de chumbo. Em 1989, a COBRAC foi vendida e incorporada à empresa Plumbum Mineração e Metalurgia Ltda, pertencente ao Grupo Trevo. A PENARROYA, desde 1994, faz parte do Grupo METALEUROP que, atualmente, detém 60% do mercado europeu e 25% do mercado mundial em seu segmento de atividades.

A Usina Plumbum se localiza à noroeste da zona urbana de Santo Amaro, a 300 metros da margem do rio Subaé, principal rio da bacia Hidrográfica do rio Subaé, no Recôncavo do Estado da Bahia.

O beneficiamento a que se propunha, destinava-se ao minério de chumbo extraído de mina subterrânea localizada no Município de Boquira, na Chapada Diamantina, BA. A sua implantação provocou, pouco tempo depois, uma série de reclamações de residentes locais, em relação à morte de gado bovino e eqüino e à perda de produção de hortas. Processo judicial solicitou o fechamento da fundição por poluir o Rio Subaé. A indústria resolveu o impasse adquirindo dos fazendeiros as terras mais próximas à fábrica. As atividades de fundição foram paralisadas em 1993, após 33 anos em operação.

No dia 2 de maio último, o Deputado Fernando Gabeira, membro da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados e relator do Grupo de Trabalho (GT) que levantou os problemas da contaminação por chumbo na região de Santo Amaro da Purificação, na Bahia – ingressou com Representação à Procuradoria da República no Distrito Federal, pedindo ao Ministério Público Federal, na figura de seu Procurador ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS a adoção de providências cabíveis para o assunto.

A despeito do GT ter indicado a possibilidade de responsabilizar os proprietários da PLUMBUM e do grupo francês Penarroya/Métaleurop, pelos impactos sócio-ambientais negativos na região de Santo Amaro da Purificação, bem como os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente, o Procurador da República considerou ser necessária a constatação do conteúdo da Representação e a atualização da situação de Santo Amaro da Purificação. Para tanto, dispôs-se o Instituto para o Desenvolvimento Ambiental - IDA, organização não-governamental sem fins lucrativos, sediada em Brasília, a fazer este diagnóstico para pautar a atuação do Ministério Público Federal.

Entre 18 e 21 de junho do corrente ano, equipe do IDA composta de LUIZ ERNESTO BORGES DE MOURÃO SÁ, Presidente da Instituição, RAUL MINAS CUIUMJIAN, Geólogo com doutorado em GEOQUÍMICA, Professor Titular e coordenador do curso de Pós-graduação do Instituto de Geociências da Universidade de Brasília (UnB) e PATRÍCIA MAZZONI, pós-graduada em Gestão Ambiental pela UnB, dirigiu-se a Santo Amaro da Purificação, acompanhada do Consultor indicado pela da Câmara dos Deputados, JOÃO SEBASTIÃO RIBEIRO SALLES.

2. Os Fatos Constatados:

Para melhor compreensão do problema da contaminação pelo chumbo na cidade de Santo Amaro da Purificação, dividir-se-á sua história em três períodos: (i) de 1960 até 1975 - representado pelo início das atividades da COBRAC até o indeferimento do pedido de expansão da indústria; (ii) de 1975 a 1993 - representado pelo início das pesquisas desenvolvidas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), até o abandono da fábrica pela PLUMBUM Mineração e Metalurgia Ltda – Grupo Trevo; (iii) de 1993 até o presente momento - representado pelas pesquisas realizadas na Universidade de São Paulo, até o encapsulamento da escória determinado pela Justiça de Santo Amaro, pela Audiência Pública em Santo Amaro da Purificação, realizada pela Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados (CDCMAM) através de Grupo de Trabalho por ela instituído, tendo como Relator o Deputado Fernando Gabeira, culminando com a visita técnica do IDA ao local.

(i) 1960-1975 – Em termos de preservação da qualidade do meio ambiente, a escolha de localização da fábrica foi muito pouco favorável: os corpos receptores tinham pouca capacidade de diluição e dispersão dos poluentes. A fábrica foi construída num vale do terreno, suavemente acidentado, a 290 metros das margens do Rio Subaé. Os efluentes líquidos eram lançados no rio, o qual apresenta baixo volume de água, sem nenhum tratamento. A partir de 1975 vários estudos e pesquisas foram efetuados enfocando os níveis de contaminação por Pb (chumbo) e Cd (cádmio) no ecossistema local e município.

A COBRAC produzia ligas de chumbo, a partir do minério de chumbo das minas de Boquira, utilizando processo metalúrgico que resultou no lançamento na atmosfera de subprodutos indesejáveis, além de gerar e dispor no solo, ao longo de três décadas, cerca de 500.000 (quinhentas mil) toneladas de escória. Segundo ensaios realizados conforme a NBR10.004, da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT, nesta escória predominam os metais pesados chumbo (Pb) e cádmio (Cd), considerados resíduos sólidos perigosos e altamente tóxicos.

De forma mais explícita, o processo metalúrgico adotado na indústria da COBRAC, realmente provocou a contaminação ambiental em Santo Amaro da Purificação, devido à utilização de tecnologias que não previam o controle seguro sobre os efluentes líquidos e gasosos, destacando-se:

(i) o material particulado emitido pela chaminé da fábrica, que poluiu a atmosfera da região;

(ii) os efluentes lançados in natura no rio Subaé, que contaminaram suas águas;

(iii) a lixiviação das águas de drenagem da escória que, ao se inflitrarem e percolarem no solo, contaminaram o lençol freático na área da fábrica; e

(iv) a escória depositada criminosamente a céu aberto, sem nenhum tratamento, que motivou sua utilização pela população e pela Prefeitura, nos jardins e pátios das escolas e na pavimentação de ruas. Os filtros instalados na chaminé da fábrica após embargo das instalações pelo Governo do Estado, apesar de conter materiais particulados de alta toxicidade, eram removidos e dispostos de forma inadequada permitindo que funcionários e transeuntes os levassem para dentro das residências e os utilizassem na forma de tapetes e colchões de dormir. Em suma, o impacto ambiental negativo das atividades da fábrica sobre o meio ambiente, se deu no ar, na água, no solo, na vegetação natural e nas atividades econômicas da região - em especial na produção hortifrutigranjeira, além da morte de animais nas áreas adjacentes ao empreendimento e, sobretudo, no comprometimento da saúde da população, conforme se pode observar no anexo “Pequeno Histórico Ilustrado da Poluição por Metais Pesados em Santo Amaro da Purificação, Bahia” retirado de trabalho do Professor Fernando Martins Carvalho, Professor Titular do Departamento de Medicina Preventiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA) que lá efetuou inúmeras pesquisas.

Em 1975, a COBRAC apresentou projeto, que foi indeferido pelo Governo do Estado da Bahia, para ampliar suas instalações industriais e aumentar a produção anual de chumbo de 30.000 (trinta mil) toneladas para 45.000 (quarenta cinco mil) toneladas.

(ii) de 1975 a 1993 - O segundo período da história da contaminação por chumbo em Santo Amaro da Purificação, inicia-se após a proibição da ampliação da produção industrial. Neste período, se intensificaram as pesquisas toxicológicas e epidemiológicas na população santamarense, realizadas pelo Departamento de Medicina Preventiva, da Universidade Federal da Bahia. Com relação à plumbemia, constatou-se que a população está contaminada com concentrações de Pb e Cd no sangue, acima dos índices permitidos pela OMS - Organização Mundial de Saúde. A maioria das crianças residentes no raio de 900 metros, a partir da chaminé, tinha concentração de cádmio no sangue acima do valor normal de referência. O nível de Pb e de Cd no cabelo da população amostrada, aumentava proporcionalmente ao aumento das concentrações desses metais pesados no solo, demonstrando inequivocamente o elevado grau de contaminação ambiental na região de Santo Amaro da Purificação.

Neste período foram realizados outros estudos representativos, dentre eles, o epidemiológico de Fernando Martins Carvalho e equipe do Departamento de Medicina Preventiva da UFBA e o outro por José Ângelo Sebastião Araújo dos Anjos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo de 1998, bem como da Empresa Teuba –Arquitetura e urbanismo s/c ltda, todos desenvolvidos na Bacia do Rio Subaé e por eles pode-se identificar que a contaminação provocada pela metalúrgica era decorrente:

· Da instalação da metalurgia na área onde predominavam ventos de baixa velocidade e constante inversão térmica, dificultando a dispersão e favorecendo a precipitação dos particulados na área urbana;

· Da proximidade da metalurgia do leito em áreas de inundação do rio Subaé;

· Da disposição inadequada da escória em aterros e seu reuso para construção de estradas e áreas residências, aumentando significativamente a contaminação d solo, águas superficiais, subterrâneas e das populações residentes por todos o município;

· Da alta concentração dos metais nos manguezais do estuário do rio Subaé contaminando moluscos que servem como base alimentar da região;

· Dos particulados expelidos pela chaminé da metalurgia, contaminando vegetais comestíveis, solo, águas superficiais e a população do município;

· De a indústria considerar a escória inócua, depositá-la sem critérios técnicos e disponibilizá-la para diversos usos;

· Do transbordamento da bacia de rejeito do período de altos índices pluviométricos na baixa vazão do rio Subaé, dificultando sua diluição e dispersão dos efluentes líquidos, que eram lançados sem tratamento;

(iii) De 1993 até o presente momento - Em decorrência dos comportamentos anteriores foram constatados diversos impactos negativos gerados pela atividade os quais são de ordem da saúde pública, da segurança e bem estar da população; das atividades sociais e econômicas, da destruição da biota, das condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e da qualidade dos recursos ambientais.

Com relação aos principais impactos destacam-se:

· A disposição inadequada da escória nas ruas, como forma de aterro, que tem proporcionado a principal forma de exposição à contaminação, em razão do contato direto das crianças com a escória pelo mecanismo da geofagia (hábito de comer terra); (Todas as crianças examinadas em 1998, 5 anos após o abandona da empresa de suas atividades, ainda apresentavam índices elevados de contaminação por chumbo no sangue);

· A utilização da água proveniente da lixiviação e /ou solubilização da escória e da vegetação pelos animais que pastam no local provocam o processo de bioacumulação e posteriormente migra na cadeia alimentar persistindo no homem;

· A disposição inadequada da escória em épocas distintas produz o desenvolvimento de processos pedogenéticos, por reações ou mecanismo de caráter químico e físico no perfil do solo pela ação de processo que levam a degradação do solo pela alteração de suas características em relação aos seus diversos usos possíveis;

· A utilização da escória como aterro em lavra aluvionar de areia do Rio Subaé, provocando a migração dos contaminantes diretamente para o rio;

· Desvalorização econômica dos terrenos em torno da metalurgia e a impossibilidade de utilização da área para outros empreendimentos;

· Impacto negativo no vetor de crescimento urbano da cidade de Santo Amaro, dentre outros motivos, em função da metalurgia ter comprado a maioria das terras do seu entorno;

· Com o abandono das suas atividades, a metalurgia causou o desemprego de seus funcionários os quais não eram aceitos em outras empresas, devido à possibilidade de ter que arcar com passivos trabalhistas que poderiam lhe ser imputados, sofrendo os ex-trabalhadores a discriminação da contaminação, que ocasionou em vários níveis o desequilíbrio psicológico dos funcionários e suas famílias;

· Elevadas concentrações de chumbo e cádmio em sedimentos e moluscos de todo ecossistema ao norte da Baía de Todos os Santos;

· O aparecimento acentuado, nas pessoas envolvidas no processo, de sintomas associados à contaminação, tais como: problemas auditivos, indisposições, sonolência, cansaço, dores articulares, problemas respiratórios, complicações pulmonares, renais, cardiovasculares, músculo-esqueléticas, do sistema nervoso, perda de memória e dificuldade de aprendizagem por perda do desenvolvimento neurocognitivo.

· As amostras de solos superficiais nas imediações da Plumbum revelaram concentrações de chumbo que representam o mais alto valor encontrado em terrenos de indústrias de processamento de metais além de valores muito elevados de cádmio. Estas concentrações estão dezenas de vezes acima dos valores estabelecidos para o cenário industrial.

3. CONCLUSÃO:

· SOBRE A CONTAMINAÇÃO POR PB E CD EM SANTO AMARO

O complexo minero-metalúrgico para produção de ligas de chumbo (Pb) na Bahia era composto da lavra e beneficiamento do minério de chumbo no Município de Boquira, sudoeste do estado, e produção de ligas de chumbo pela usina metalúrgica em Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo Baiano. Durante o período de produção de ligas de chumbo e escórias (1960-1993), o processo metalúrgico empregado (sinterização e redução do sinter) resultou em forte contaminação no meio ambiente por meio de material particulado expelido pela chaminé, efluentes líquidos despejados diretamente no rio Subaé e transbordamento da bacia de rejeito, águas de drenagem da área de estocagem da escória.

O agente poluidor mais devastador em Santo Amaro foi, muito provavelmente, a emissão pelas chaminés nas instalações da fundição.

Dados obtidos por pesquisadores da USP e UFBA, observações, depoimentos e dados analíticos obtidos recentemente pela equipe do IDA e mais especificamente pelo Prof. Raul Minas Kuyumjian (IDA/UnB) são sumarizados a seguir:

a) a escória deixada no local contém até 21% de Cd e até 3% de Pb.

b) a contaminação atmosférica por Pb devido ao material particulado expelido pela chaminé foi, provavelmente, a mais intensa e devastadora.

c) a escória amontoada (490000 toneladas contendo 35 g/t de Cd e até 3% de Pb) nas dependências da fábrica, em local com declive topográfico em direção ao curso do rio Subaé, distante 290 metros das instalações da fundição foi, pelo menos por um bom tempo, transportada, por gravidade e/ou lençol freático, para o curso do rio.

d) A água circulante (contaminada) no processo de fundição era lançada no rio Subaé.

e) estudos efetuados no solo da área da metalurgia revelaram elevadas concentrações de Pb e Cd nos níveis mais superficiais do mesmo, indicando forte adsorção dos metais pelo solo superficial (até 30 cm), decorrente de altas concentrações de matéria orgânica, alta capacidade de troca catiônica (CTC) e presença da argila montmorillonita. Esta retenção dos metais pelo solo superficial não impediu mas atenuou a migração dos poluentes às águas de subsuperfície.

e) os estudos e avaliações efetuados ao longo dos últimos 25 anos demonstram a diminuição, mas não a eliminação, dos níveis de contaminação por Pb e Cd em Santo Amaro da Purificação.

f) As medidas e procedimentos implementados no sentido de remediar a contaminação foram aplicados de forma tecnicamente incorreta e/ou restaram parcialmente ineficazes.

g) O encapsulamento da escória foi efetuado de forma incorreta posto que na superfície do material de recobrimento observa-se grande quantidade de fragmentos da escória, que obviamente são submetidos ao transporte para baixo e lateralmente por água pluviais. O material de recobrimento da escória apresenta várias fendas devido a acomodações e ação de água pluviométrica, e é intenso o transporte, pelas formigas, de fragmentos da escória em profundidade para a superfície.

h) a base do calçamento de várias ruas da cidade é constituída de uma camada de alguns centímetros de areia e, abaixo desta, escória (a escória está a 30-40 cm abaixo do calçamento). A escória está presente em rebocos de construções civis e recobrimentos em jardins públicos e pátios de escolas (em São Brás-Cachoeira da Vitória houve distribuição sem controle da escória para a população).

i) estudos efetuados em 1977 evidenciaram elevados níveis de contaminação por Pb e Cd nas águas do rio Subaé, cujo curso atravessa a cidade de Santo Amaro, quando então é utilizado para atividade de pesca e deleite das crianças.

j) em Caieira e Destilaria (periferia de Santo Amaro da Purificação) ocorre a pesca de mariscos, comprovadamente contaminados por Pb e Cd, no estuário do rio Subaé na Baia de Todos os Santos, situado a 10 km da metalurgia.

k) a contaminação por Pb afetou a produção agrícola e pecuária local, consumida, pelo menos em parte, pela população local.

l) toxicologia em crianças e adultos tem revelado níveis significativos de Pb e Cd em cabelo e sangue, principalmente em crianças.

m) Os principais efeitos da contaminação (contato, inalação e ingestão) por chumbo em Santo Amaro da Purificação são os seguintes: problemas respiratórios, renais e hepáticos, anemia e perda parcial da memória. Leucemia é mencionada. Portanto, a contaminação atingiu todo o ecossistema da área de Santo Amaro: solo, água, flora, fauna e saúde humana, principalmente crianças.

n) Os órgãos públicos municipais, estaduais e federais, além dos empreendedores, obviamente, não adotaram as providências cabíveis, não proporcionaram os recursos financeiros necessários e nem mesmo condições médico-hospitalares para o tratamento da população já contaminada.

o) Muitos dos operários que trabalharam na fundição ainda lutam por aposentadoria e/ou indenização. Muitos morreram por doenças relativas à contaminação, porém não reconhecidas como tal. Os operários que exerceram atividades na fundição foram e são rejeitados por outras indústrias, quando da oferta de empregos por medo da possibilidade de lhes ser imputado o passivo trabalhista da COBRAC/PLUMBUM. A questão social das famílias dos trabalhadores da metalurgia é grave.

p) A cidade ficou sendo apresentada como “uma das mais poluídas do mundo” na literatura internacional sobre contaminação ambiental por chumbo, tendo perdido todo seu potencial turístico proveniente de sua arquitetura colonial e de sua perspectiva histórica.

· SOBRE A IMPLEMENTAÇÃO DA REMEDIAÇÃO
As zonas alagadiças e diques de retenção já estabelecidos no âmbito das instalações da metalurgia apenas limitam a migração lateral dos poluentes, principalmente em direção ao rio Subaé.

Embora a natureza argilosa e orgânica do solo no local contribua fortemente para a retenção dos poluentes, a migração de Pb e Cd para baixo, em direção ao lençol freático, certamente ocorre.

Portanto, as medidas remediadoras concretizadas até o presente e a natureza do solo no âmbito do sítio da metalurgia, somente são eficientes no sentido de limitar, mas são incapazes de eliminar ou anular os processos que promovem a contaminação.

O encapsulamento da área de escória foi efetuado de forma tecnicamente inadequada e incorreta. Embora o mesmo possa ser refeito adequadamente, a medida mais recomendável, definitiva, é a remoção da escória existente no sítio da metalurgia, depositando-a em local apropriado.

O longo tempo de residência do Pb no ecossistema e a natureza cumulativa da contaminação por Pb e Cd justificam a remoção da escória, não somente daquela existente no sítio da fundição, mas também daquela em aterros e calçamentos realizados pela Prefeitura de Santo Amaro.

No entanto, no caso dos calçamentos, deve-se proceder a monitoramento da contaminação (por meio de poços para o estudo do perfil de solo e água do lençol freático), sendo que a remoção da escória deverá ser efetuada dependendo dos níveis de contaminação. Há técnicas apropriadas para conter o processo de contaminação no caso de níveis de contaminação não elevados.

O sítio de localização da Indústria Metalúrgica deve ser descontaminado, sendo a planta industrial, que se encontra semidestruída, removida devendo receber destinação adequada, possibilitando a utilização segura da área para outros empreendimentos.

A Mina de Boquira, atualmente desativada, deve sofrer um procedimento de “retorno a seu estado natural” assegurando-se que ela não represente um perigo para a população do município e de seus vizinhos e para o meio ambiente. Isto significaria, no mínimo, fechar definitivamente os muitos acessos às galerias e poços, assegurar a estabilidade do terreno de modo a evitar riscos de desabamento, remover as construções civis existentes na superfície e checar, bem como tratar, se for o caso, a água dos “pits” da mina antes de devolvê-la ao meio ambiente, garantindo que não apresente nenhum risco ambiental.


Deve ser efetuado, também, na região de Boquira, o monitoramento da qualidade da água nos rios da bacia hidrográfica local e feita a desmontagem dos “pit-head” antes dos procedimentos de recuperação da área degradada, que englobaria, inclusive, a recomposição da vegetação original, se possível, tudo através de um Plano de Recuperação de Área Degradada – PRADE, aprovado pelos órgãos ambientais competentes.

A implantação de um Plano de Gestão Sócio-Ambiental para Santo Amaro da Purificação é essencial no sentido de reduzir ou mesmo eliminar os níveis de contaminação existentes em solos e águas locais, promover condições para a qualificação da saúde pública e atender aos diversos problemas sociais gerados pelo empreendimento.

Segundo o apurado pode-se concluir que o caso da Plumbum apresenta-se como um exemplo clássico de um sítio negligenciado pelo empreendedor, apresentando um grande passivo sócio-ambiental ainda não quantificado e com ações desenvolvidas pelos órgãos públicos meramente de forma paliativa, não sendo apresentadas nenhum tipo de proposta de solução definitiva do problema.

SUGESTÕES:
i. A criação, em uma primeira fase, de um Grupo Operativo coordenado por instituição ambiental sem injunções políticas locais, composto dos especialistas que estudaram o assunto, representantes da Sociedade Civil atingida, do governo em suas várias esferas e das empresas envolvidas, para em prazo máximo de três meses, propor, na forma de um Plano de Gestão Sócio-Ambiental, soluções técnicas e medidas sócio-ambientais cabíveis e aceitáveis pela população, no sentido de remediar o passivo deixado pelo empreendedor. O grupo deveria propor, também, um PRADE para a região de BOQUIRA.

ii. A implementação, em uma segunda fase, do Plano de Gestão Sócio-Ambiental e do PRADE produzido na primeira fase.

iii. A adoção, pelo órgãos federais, estaduais e municipais competentes, de medidas normativas/legais que tornem obrigatória nos Estudos de Impacto Ambiental e/ou Relatórios (EIA/RIMA) bem como no Licenciamento Ambiental, a disponibilização prévia dos recursos necessários, sob forma de compensação ambiental (já prevista em Lei), para os procedimentos destinados à desativação segura das instalações e retorno do meio ambiente afetado às condições originais existentes antes do empreendimento.

Brasília, em 08 de julho de 2002.
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P/ IDA