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Batalhas antigas, novas estratégias


                                                                        Fonte: O Estado de S.Paulo

Por Liana John em 28/11/2002

Cresce a expectativa de controle do mercado de madeira e a possibilidade de melhorar a sustentabilidade do extrativismo.

Campinas - Nas últimas duas semanas, foram adotadas/anunciadas algumas medidas, que tratam de problemas ambientais crônicos, de difícil solução porque contaminados pela burocracia e/ou corrupção. São batalhas antigas, com combates ´definitivos´ várias vezes ensaiados, mas de solução ainda incerta, embora as novas estratégias soem como bons sinais e sejam, por isso, bem vindas.

Duas das recentes medidas estão relacionadas ao setor madeireiro, em especial ao controle da extração de madeira da Amazônia, que, como se sabe, em alguns casos, está nas mãos de verdadeiras quadrilhas, que se valem de esquemas de corrupção sempre renovados, com uma criatividade e capacidade de adaptação surpreendentes. A votação contra a MP-62, no Senado, e o lançamento do Sisprof, no Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

No último dia 20, o Senado derrubou a Medida Provisória 62, que permitia o leilão de madeira ilegal apreendida, sem fazer restrições quanto aos compradores da madeira. Esta MP substituía uma resolução anterior, do Ibama, que destinava a madeira apreendida apenas para a construção de casas populares. Na prática, o leilão (que já existia antes da decisão das casas populares) permitia que o madeireiro autuado por extração ilegal comprasse de volta a madeira apreendida, legalizando a atividade predatória.

Ao derrubar a MP-62, o Senado desarticulou temporariamente o velho esquema de esquentar produtos florestais de origem duvidosa. Mas a medida só se completa com a desarticulação dos outros componentes do esquema de burocracia e corrupção, que asseguram bons lucros e impunidade às quadrilhas de exploradores de madeira. E este é o propósito do Sistema Integrado de Monitoramento e Controle dos Recursos e Produtos Florestais ou Sisprof, lançado oficialmente neste dia 26 de novembro, após uma gestação de 4 anos e período de testes de 1 ano.

O Sisprof une diversas tecnologias - de geoprocessamento de imagens, rede virtual e banco de dados - para tentar colocar o mercado de madeira na legalidade. Em seis meses, o Sisprof pretende substituir as famosas Autorizações para Transporte de Produtos Florestais, vulgo ATPFs, atualmente negociadas em um mercado paralelo, que envolve múltiplo uso de uma mesma autorização, falsificações grosseiras e a compra de papéis frios dentro do próprio Ibama. No lugar das ATPFs entram os Selos de Origem Florestal (SOF), impressos em gráficas de segurança e entregues pelo Correio, sem passar pelas mãos de funcionários do Ibama. Os selos têm código de barras, que, aliados aos bancos de dados sobre planos de manejo autorizados, permitem saber se cada metro cúbico de madeira fiscalizada está de acordo com a lei, qual sua origem e quem responde por ela.

Sem dúvida, é um dos sistemas mais sofisticados do mundo, sem equivalentes, mesmo nos países industrializados, onde a margem mais estreita de impunidade costuma limitar a ousadia dos infratores. Se vai funcionar, independente da torcida a favor, ainda é uma incógnita.

Outra medida importante, recém anunciada, é a concessão do direito real de uso dos recursos naturais em reservas extrativistas. Por se tratar de uma invenção brasileira - e novidade no universo das unidades de conservação - o modelo de reservas extrativistas ainda está baseado em uma legislação imperfeita, que tende a ser ajustada, com o tempo. A concessão de uso era um dos ajustes fundamentais, cuja necessidade foi detectada logo após a criação da primeira reserva extrativista, no Acre, em 1990. Mas a possibilidade de regulamentar a matéria só surgiu agora, 12 anos depois.

A concessão visa, entre outras coisas, driblar a burocracia que só permitia financiamento governamental à produção florestal para quem tivesse posse legal da terra. Numa reserva extrativista admitem-se moradores, mas a terra é da União. A concessão de uso muda a condição do extrativista e o credencia para obtenção de crédito, vital, neste momento, para assegurar diversos mercados nascentes, de produtos florestais não madeireiros.

Em resumo, dois dos principais pilares do desenvolvimento sustentável, na Amazônia - a extração madeireira e o extrativismo - estão reformados, com caminhos desimpedidos. O novo governo já assume em condições de seguir sem grandes tropeços, se demonstrar competência para reconhecer e manter afastados os lobistas dos velhos esquemas.

Liana John é jornalista.